Primeira vez

Naquele inverno, as férias seriam em Bariloche. Brincar na neve, com roupas astronáuticas amarelas sobre o imenso branco, abrir as janelas para admirar as paisagens, sentir o estremecimento causado pelo bafo frio vindo de fora, respirar até doer as narinas…

Ao lado do hotel, a agência de viagens nos permite escolher quase todas as atividades do lugar. A começar pelo chocolate quente, depois o passeio pela “aerosillas” com direito a pequena tempestade, o gelo açoitando o rosto quais agulhas voadoras. Seriam cinco dias de corre-corre, estômago reclamando e chocolate.

Para quem via a neve por primeira vez, a única estranheza era que enquanto no alto se via alva e fofa, na cidade transformava-se em torrente de água clara escorrendo pelos cordões das calçadas. Degelava. Tudo novo, bonito, agradável. O principal, digamos, contratempo, era a corrida ao banheiro e a fome inesperada e inusual… Mas quem se incomoda com isso? Tendo o céu azul e o passeio de barco pelas águas escuras, glaciais e profundas do belíssimo Nahuel Huapi… Um friozinho na barriga ao imaginar uma queda ali. Morrerei afogada ou congelada? Os olhos não se deslocam da quina do barco abrindo caminho pela belezura do lago. E o que dizer do Parque Nacional de Los Arrayanes com suas magníficas árvores altas (arrayan), ostentando nos cerca de quinze metros de altura a cor canela dourada?

Como acontece em qualquer passeio, houve o ângulo cômico. Na travessia de um dos morros nevados, “cadenas” nas rodas do jipão, uma parada. À frente, num Fiat minúsculo, cinco moças, presas na neve. Decididas algumas descem do carro, levantam o veículo desatolando-o e se vão liberando o caminho.

A semana termina deixando saudade antes mesmo de partirmos. Um excesso de chocolate nas “provas” em diferentes lojas na Calle Mitre para escolha do que trazer, derivou em um escuro vômito enquanto fazia as malas. Seria eu alérgica à gostosura? Um pensamento cruza os caminhos tortuosos da mente. Pesquiso a agenda coberta de anotações: Heureca – estou grávida!

Por Vilma Vianna

Texto integrante do projeto de exercício literário proposto pela Pragmatha Editora em suas redes sociais. Participe! Em caso de dúvida, converse com a editora Sandra Veroneze pelo e-mail sandra.veroneze@pragmatha.com.br