O melhor presente da vida

O presente chegou com cinco anos de atraso e, com visível euforia, Antenor gritou: “foi o melhor presente da minha vida!”. Acolheu-o com todo amor, uma quantidade de amor jamais despejada antes. No fundo sabia que esse presente chegaria, mais cedo ou mais tarde. Toda vez que ficava ansioso por esse momento, uma força estranha o fazia entender que a espera valeria a pena.

Antenor conheceu Íris por acaso em Águas de Lindóia, uma linda cidade conhecida por suas águas termais. Ela de passeio e ele em férias na casa dos pais. Encontraram-se na praça central em um final de tarde e foi imediato o cruzar dos seus olhos. Em pouco tempo já estavam sentados em um banco trocando amenidades sobre as suas vidas. Ao olhar do pipoqueiro pareciam extremamente íntimos.

Antenor já era homem maduro, à espera da aposentadoria. Descasado duas vezes, sem filhos, pendurava-se nos pais, ainda com bastante saúde, para driblar a solidão. Ela, de meia idade, sem profissão definida e atrás do amor da sua vida, na época um personal trainner que mudara-se para a cidade para trabalhar em um hotel.

Naquele dia Íris buscara a praça para espairecer o fora que ganhara do seu grande amor. A tentativa mais uma vez falhou. Precisava pernoitar aquela noite por lá, pois ônibus não havia para descer para Campinas, a sua cidade.

Sem dinheiro, sem eira nem beira, confidenciou a Antenor a situação e, como habitualmente sabia jogar, jogou todo o seu charme para cima dele, inescrupulosamente.

Em pouco tempo acabaram na cama dos pais de Antenor, sem receio de nada. Noite tórrida para ele e normal para ela, já que sexo era o que nunca lhe faltara.

No dia seguinte, Íris tomou o seu rumo e Antenor permaneceu na cidade até o fim das férias. Algo mudou radicalmente para ele. Sim, aquela noite tinha sido diferente de todas as outras, ele como homem tinha sido diferente de todos os outros homens que havia incorporado nas suas outras noites quentes.

Cinco anos se passaram quando ele, já aposentado, residindo em São Paulo, recebeu um telefonema de um advogado alegando que ele tinha um filho de quatro anos e meio de idade. Pediu exame de DNA, o qual foi prontamente aceito por Antenor logo que soube o nome da mãe. Em uma semana recebeu a confirmação através do advogado, acompanhada pela foto do menino.

Um filme passou pela sua cabeça. Certamente ela engravidara e tentara segurar o personal com o filho. Não deu certo. O caminho seria procurar o pai verdadeiro, especialmente porque Miguel era visivelmente parecido com ele.

Com o melhor presente da sua vida garantido, Antenor, contrariando o seu perfil, tomou uma coragem imensa e gritou aos quatro cantos o quanto estava feliz. E como gritou. Gritou tanto de felicidade que a vizinha do apartamento da frente bateu à sua porta. Foi literalmente desconsiderada.

Não tinha mais tempo para explicações. Havia muito por viver com Miguel.

Por Rosalva Rocha

……..

Texto integrante do projeto de exercício literário proposto pela Pragmatha Editora em suas redes sociais. Participe! Em caso de dúvida, converse com a editora Sandra Veroneze pelo email sandra.veroneze@pragmatha.com.br