“Um certo janeiro” reúne poemas-crônicas desenvolvidos diariamente ao longo do mês de janeiro de 2021 pelo escritor Leonardo Andrade. Retrata o paradoxo de um momento peculiar: por um lado um início de ano, símbolo de renovação de esperanças, e por outro lado o agravamento de uma epidemia, que tem desestabilizado a humanidade. Nesta entrevista, Leonardo fala sobre o simbolismo e importância de sua obra enquanto leitura e retrato de um tempo.
“Um certo janeiro” revela a literatura e a escrita criativa como um recurso terapêutico para você?
Sem dúvida, é fundamental termos um canal de comunicação permanentemente em aberto e o usarmos dentro das escolhas que mais nos satisfazem. Escrevendo me sinto conversando com meu leitor, expondo meus pensamentos e até insights adquiridos com outras pessoas. Para mim, escrever é uma forma de reavaliar meus sentimentos , ideias e ideais, é a minha terapia perfeita.
A obra foi produzida em janeiro e o lançamento acontece em março. Hoje comparando as duas realidades, qual o seu sentimento?
O livro é uma espécie de diário ou registro deste mês de janeiro. Foi escrito ao longo deste perído e dessa forma revela sentimentos contraditórios, como tristeza e esperança, um marco da ambiguidade que estava no ar. Há dias com um pitada a mais de esperança e outros de desilusão. O sentimento deste momento é de que foi algo premonitório, uma parte de um ciclo que ainda não mudou e não sabemos quando vai passar. Estamos numa época de muita tristeza.
Cada poema é acompanhado pelas principais notícias do dia. Literatura e jornalismo são duas formas de olhar e retratar a realidade. Como foi essa experiência?
Foi muito impactante, quase mística. Depois de um tempo não sabia mais se tinha tirado a ideia de uma notícia ou de uma possível dedução de um fato. O que acontece com o jornalismo e a literatura é similar ao que acontece com a vida e a arte, uma influencia a outra e elas se misturam, pois no fundo bebem na mesma fonte. São dois universos com uma intersecção muito forte e têm limites tênues e variáveis. Nem sempre conseguimos separar com precisão a realidade e a ficção.
Como escritor, o que “Um certo janeiro” significa para você?
Em síntese, meu passaporte para a eternidade. É um livro falando de um espaço curto e específico, um registro histórico desse terrível janeiro de dois mil e vinte e um. Ele contém manchetes diárias, impressões e posicionamentos meus e de diversas pessoas com quem interagi ao longo do período e me tornaram (conscientemente ou não) porta voz de suas insatisfações, esperanças e sentimentos. É um livro para ler, reler, pensar, repensar, fazer anotações e consultar em momentos futuros – para nunca se permitir “deslembrar” de tudo que passamos e ainda estamos passando. É uma espécie de fotografia em forma de escrita desse tempo.