Exercício literário: “As luzes da cidade”

“As luzes da cidade” é a imagem desta semana do exercício literário proposto pela Pragmatha Editora em suas redes sociais. Os escritores são instigados a produzir um texto em prosa e ficcional inspirados nela. Os exercícios são publicados sempre aos domingos, tanto no Facebook quanto no Instagram, e os textos recebidos, e selecionados, às sextas-feiras. Participe! Em caso de dúvida, entre em contato com a editora Sandra Veroneze pelo email sandra.veroneze@pragmatha.com.brConfira abaixo os textos recebidos nesta semana.

Fila preferencial

Ao ligar a sirene, a polícia acelerou a velocidade atrás do Fiat 147 amarelo. Cantando pneus, o fusca de investigação finalmente conseguiu alcançar os procurados, fazendo-os sair de mãos para cima. Eles estavam sendo observados há meses por conta da suposta trama de venda de narcóticos ilegais. No entanto, os detetives se surpreenderam com as duas senhoras idosas que, vestindo chapéus de palha, saia plissada rosa, óculos de sol enormes e salto alto, ao desligarem a música Night Fever, dos Bee Gees, saíram do carro antigo elegantemente e questionaram o que estava acontecendo. Os oficiais se desculparam e explicaram às duas idosas que estavam à procura de dois traficantes jovens que, também, dirigiam uma máquina italiana amarela. Constrangidos com o engano, deixaram Maria e Joana seguir seu caminho, voltando à delegacia. Elas, porém, entraram no carro, olharam-se, riram, e disseram uma para a outra: “Eles sempre acham que os traficantes são homens”. E seguiram seu caminho até a próxima vila. 

Por Gilberto Broilo

…………………………………………………………………………………

Reviravolta

Essas luzes coloridas, essa profusão de raios, essas nuances quentes em meio ao trânsito me fazem sentir viva, latente, feliz. Aos vinte e três anos sinto-me renovada, transitando nesta cidade efervescente, feito borboleta faceira em meio às avenidas.

Aos doze anos de idade eu já havia prometido aos quatro cantos que sairia daquele buraco, daquele lodo que permeava a minha cidade natal. Certamente nasci naquele lugar por engano, pois nunca fui chegada à feiura e depressão. E Santo Amaro da Mansidão é lugar dos piores, no qual nem as plantações vingam. Eu já nasci tendo pressa, com sangue quente nas veias, sedenta por conquistar o meu espaço com determinação. Eu prometi que sairia de lá e, junto, levaria meus pais e meus três irmãos, nem que para isso eu precisasse trabalhar de sol a sol.

E a promessa se cumpriu quando eu tinha dezesseis anos e adentrei ao mundo real, à capital do meu estado, distante 600 quilômetros.

Quando pisei em Alcântara renasci por completo. Não foi preciso um minuto para eu sentir que aquele era o meu lugar. Meus pés tinham aderência às calçadas, ao asfalto, ao sol, ao calor e a chuva.

De início comecei a fazer faxina nas mansões do condomínio onde meu tio era porteiro e, em muitos poucos meses, acabei baby sitter de três crianças, conferindo-me um salário pequeno, mas confortável para o meu padrão de início de vida. Sim, eu estava literalmente iniciando a minha vida.

E não foi preciso muito tempo para eu encontrar uma escola para estudar e, por tabela, fazer uma faculdade de Comunicação Social. Muito esforço? Não, porque eu fiz o que queria, com todo o meu entusiasmo, desde que cheguei em Alcântara. Amparei minha família, que, em muito pouco tempo, já conseguiu manter-se com dignidade. Minha mãe cozinhava em duas casas três vezes por semana e meu pai ocupava-se com cortes de grama em diversas casas do mesmo condomínio e, em pouco tempo, com todo o seu conhecimento na agricultura, passou a criar pequenas hortas nas mansões e, consequentemente, levar conhecimento dos alimentos orgânicos aos ricaços que o recompensavam muito bem. Meus irmãos já estavam finalizando o segundo grau.

Hoje sou fotógrafa e grande parte do meu trabalho é feito à noite, em casamentos, bodas e formaturas. A conjunção da beleza da noite e suas luzes vem me inspirando a tal ponto que muito em breve conquistarei o meu tão sonhado estúdio e de lá eu traçarei arrojadas metas, muito distantes de Santo Amaro da Mansidão, um lugar distante, tão distante que nem meus mais remotos pensamentos conseguem chegar.

Por Rosalva Rocha

…………………………………………………………………………………

Ao observar

O seu fusquinha 68 era um sonho. Todo original, com exceção do alternador, única peça modificada em seu motor de muitas léguas de chão.

Glaudisnei estava tão entusiasmado com seu velho novo possante que resolveu dar um giro pela cidade e apresentá-lo aos colegas.

Estacionou em frente a uma boate que era ponto de entrada e saída de muita gente importante, mas ninguém prestou atenção em seu veículo, que ele mantinha como relíquia. Decidiu observar o porquê das pessoas e focou na importância daquilo que os outros consideravam importante.

Notou então que eram idas e vindas de espectros vazios buscando em vão sem saber o quê, mas permaneciam ali.

Lugar notório, assuntos banais talvez mentes distraídas acopladas a corpos subjugados aos seus comandos, e assim encerrou a noite.

Voltou para casa e sentiu-se satisfeito por não ser mais um a entrar para a inércia do tempo.

Pois conscientizou-se de que, independentemente das atitudes, deixamos registrado cada episódio como momento único. E assim seguimos todos com ou sem propósitos, encurtando nossa trajetória. Alguém presta atenção nisso, pensou, concluindo que todos estavam suficientemente ocupados para não reparar em seu fusca estacionado. E salientou: estacionado.

Por Nelci Bach

……………………………………………………………………………….

Errante

Postes, holofotes, lanternas e faróis, luzes artificiais sobre nós.

Hoje não tem estrelas nem lua, há uma névoa pairando na rua.

A visão fica levemente distorcida, a percepção se sente perdida.

Sigo sem direção certa, tentando não fugir muito da reta, mantendo a mente aberta.

Atento aos meus ouvidos, aos meus sentidos e aos múltiplos sons indefinidos.

Não há rota demarcada, estrada iluminada nem rota mapeada.

Embora não saiba exatamente para onde ir, sei que preciso seguir e me preparar para o que está por vir.

Sou parte sim e não, Yin e Yang, noite e dia, companhia e solidão.

Aprendi a caminhar nos dois lados, a não me prender a territórios demarcados, a conviver com meus lados tão errados.

Sou um perpétuo viajante, errante, por vezes mais perto da minha essência, em outras, um pouco mais distante.

Por Leonardo Andrade

……………………………………………………………………………….

O carro banhado por cores
Um carro azul parado, refletindo sua cor azul em várias cores. Até parece um arco-íris! Olhando e vendo o capô, parece ser um fusca… Não se vê nitidamente! Pode ser um carro qualquer, ou deixar sua imaginação escolher o carro. Parece ser de noite pela proporção do que se vê, como pode ser de dia, refletindo as cores na luz do dia.  Fica-se em dúvida por causa das luzes das cores refletidas na imagem. O importante é que se vê um carro refletido nas luzes das cores diversificadas e lindas. Se torna um momento romântico ao admirar o carro.


Por Roselena de Fátima  Nunes Fagundes

……………………………………………………………………………….

Noite do prazer

             André estava todo animado. O luau que rolaria mais tarde na praia deserta estava prometendo. Até saiu mais cedo de casa, para não pegar muito trânsito, mas pegou assim mesmo — pensou e sorriu. Começou a cantarolar uma música que estava tocando na rádio FM, um grande sucesso…“A noite vai ser boa boa/ de tudo vai rolar/ Vai rolar/ De certo que as pessoas querem se conhecer…”. De repente uma briga começa logo na frente. André pergunta a um cara que estava com o carro parado no trânsito ao seu lado:

            — O que está acontecendo?

            — Acredito que foi alguma batida. — ele responde e fica quieto.

            O som no carro de André continuou, e ele também a cantarolar, acende um cigarro, aumenta um pouco a voz “… prazer de estar contigo/ Um brinde ao destino/ Será que o meu signo tem a ver com seu, seu?

            André só sente um soco na sua orelha, ele tenta se defender, mas recebe outro, e outro…

            Ouve bem longe, o cara esbravejando:

            — Essa bicha estava me cantado, o safado até puxou assunto…

            André quer falar que ele estava errado, mas não consegue o seu rosto já está todo ensanguentado, sua boca também. O cara pega a arma e dá dois tiros. André arregala os olhos e, sem entender, cai de lado. A música chega ao fim, “…sinto por dentro uma força estranha/ Vibrando, uma luz/ A energia que emana/ De todo prazer”.

Por Giovana Schneider