“Ao pé do verso” é o projeto da Pragmatha que se propõe a investigar os bastidores da produção poética. Nesta edição, o poema escolhido é “Puer Aeternus”, de Leonardo Andrade, que foi publicado no livro “Grãos – Pensamentos vãos e desvãos”.
Alguns de seus versos:
Queria que meu corpo físico me acompanhasse e refletisse
Mas ele é efêmero e se rendeu às mazelas da velhice
Tudo bem, ele não me representa, e me chatear com isso é tolice.
Nesta entrevista, o autor fala sobre o processo e contexto de criação do trabalho, bem como percepções pós leitura.
Como surgiu a ideia desse tema?
Eu gosto de explorar conceitos/expressões e suas dualidades. Tenho um lado que se recusa a crescer e tento equilibrá-lo com a maturidade e o peso dos anos que já vivi. Como coloquei no poema, uma parte minha ainda tem dezessete anos e meu desafio é que essa seja a porção boa, a que gosta de novidade, inovação e mantém sempre acesa a chama da esperança. É um poema parcialmente autobiográfico e escrevê-lo foi uma forma de mostrar um pouco mais para os meus leitores o homem por trás das palavras.
Em que contexto ele foi escrito?
Fiz um curso com um astrólogo fantástico e meu amigo particular, o Fernando Fernandse (é Fernandse mesmo, ele mudou por ter muitos homônimos) e neste curso foi abordada a história de Peter Pan, que é o próprio Puer Aeternus (expressão em latim para menino eterno), tanto que na psicologia é conhecido como síndrome de Peter Pan e durante a aula já comecei a imaginar como escrever sobre o tema. Escrevi logo em seguida e o texto já veio pré-formatado na minha cabeça. Era algo que eu precisava dizer e andava calado há algum tempo.
O poema pretende passar alguma mensagem?
A grande mensagem do texto é que a maturidade não deve excluir totalmente uma parte infantil. Ambas devem coabitar em harmonia, explorando suas melhores facetas e extraindo suas melhores qualidades. Elas são necessárias e vitais e em nenhuma hipótese devem se anular. É muito bom se sentir jovem em algumas nuances. Eu, por exemplo, leio tanto Umberto Eco e Edgar Morin, quanto Stephen King e histórias e quadrinhos. Gosto de filmes com mensagens profundas, mas também assisto a desenhos animados e lido bem com isso. Sou como o antigo slogan dos jogos da Grow, para todas as idades entre 8 e 88 anos e talvez antes e além.
O que você sente relendo hoje o poema?
Esse projeto fantástico da Pragmatha, de explorar os poemas, está me dando uma oportunidade maravilhosa de reler meus textos e perceber nuances que eventualmente passaram despercebidas. Neste caso específico, quanto mais leio o “Puer Aeternus”, mais me apego a ele. O texto é um grito de liberdade do eterno jovem que não suporta ser oprimido pelo peso do tempo e pelo julgamento alheio, mas o que precisa se tornar claro é que este jovem não quer impedir a chegada da maturidade e sim deixar sua chegada mais leve, harmônica. Quer aprender não por imposição e sim como evolução natural. Envelhecer não precisa ser necessariamente doloroso. Devemos tornar esse processo enriquecedor e prazeroso, degustando cada novo tom que a paleta da vida nos oferta, é vital encarar a vida como uma dádiva e não como um fardo.
Puer Aeternus
Não me incomodo de ser taxado como Puer Aeternus
Guardei o lado bom e não o peso dos invernos
Mantive escrito só o que quis nos meus cadernos.Sou eternamente jovem, me fixei nos meus dezessete anos
Não vejo sentido em amadurecer e cometer conscientes enganos
Ser adulto é carregar o peso de incontáveis e dolorosos danos.Assumir responsabilidades é um fardo muito pesado
Não estou e provavelmente nunca estarei preparado
Não me questione, sempre estou certo e você errado.Queria que meu corpo físico me acompanhasse e refletisse
Mas ele é efêmero e se rendeu às mazelas da velhice
Tudo bem, ele não me representa, e me chatear com isso é tolice.